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Conte algo que não sei

“Para mim, a radiologia é o melhor trabalho do mundo. Com ela podemos capturar imagens de dentro das pessoas sem prejudicá-las. Trabalho no desenvolvimento de novas técnicas nessa área em um hospital e é muito gratificante ver o que começou como uma ideia da física ou da matemática salvar a vida de alguém”

Conte algo que não sei.

A ressonância magnética (RM) é o mais detalhado exame de diagnóstico por imagem que temos. É como viajar por dentro do corpo. Mas o que muita gente não sabe é que tudo em torno dela hoje é qualitativo. Usamos palavras para descrever os resultados. Dizemos, por exemplo, que algo é mais claro, ou mais escuro, do que deveria ser. Tudo depende da nossa experiência e de quais palavras escolhemos para descrever o que vemos. É muito subjetivo, e não há outra área da Medicina que seja assim.

E como a nova técnica desenvolvida em seu laboratório muda isso?

O que estamos tentando fazer é que a RM seja como o resto da Medicina, que possamos associar números ao exame, como em nosso peso, nossa pressão sanguínea ou nossa frequência cardíaca, pois são eles que nos permitem tomar decisões quanto a tratamentos. Do jeito que a RM é feita hoje, já podemos ver muitas coisas, mas queremos levar o exame para o futuro. Assim, desenvolvemos um método, chamado de “impressão digital”, em que podemos obter estes dados quantitativos, os números, num tempo de uso do equipamento equivalente ao de um exame normal. E agora que temos os números, eles nos dizem muito sobre as doenças que vemos.

E quais são os exemplos de aplicação clínica disso?

Queremos ser capazes de dizer se uma lesão está melhorando ou piorando, se um tumor está crescendo ou morrendo. No caso do câncer, se você tem um tumor, faz quimioterapia, passa pelo tratamento e espera três meses para fazer um exame a fim de saber se ele cresceu ou se diminuiu. Perde-se muito tempo que poderia ser usado em uma terapia eficaz, e isso pode ser a diferença entre a vida e a morte.


A ressonância magnética funcional (fMRI) tem sido muito usada nas pesquisas de neurociência em busca de melhor compreensão do funcionamento da mente humana. Chegará o dia em que poderemos “ler” pensamentos com uma máquina?

De certa forma já é possível “ler” a mente com a fMRI hoje. Um pesquisador, Jack Gallant, na Universidade da Califórnia em Berkeley, está fazendo algo que é preciso ver para crer. Durante muito tempo tive dúvidas e fui cético quanto a essa possibilidade. Não achava que um dia teríamos sensibilidade para ver esse tipo de coisa, mas as pesquisas de Gallant mudaram minha opinião. É incrível! Eles mostraram às pessoas cenas de filmes e montaram uma “biblioteca” de sua atividade cerebral enquanto as assistiam. Então, pegaram essas pessoas e mostraram a elas cenas diferentes, só gravando o padrão de atividade de seus cérebros. Eles adivinharam, só com os dados da fMRI, como era a cena que estavam vendo no momento. Não é perfeito, mas é muito bom.


Mas também temos o caso de um estudo, na verdade uma crítica, que demonstrou que, do jeito que muitas dessas pesquisas são feitas, é possível encontrar atividade cerebral até em um salmão morto, o que lhe valeu o Prêmio IgNobel de Neurociência em 2012...

Se seu experimento está mal modelado, você sempre vai encontrar algo. Não é difícil ver alguma coisa quando se está procurando muito por ela, especialmente quando se monta errado o experimento. A fMRI é muito difícil de fazer, pois você está detectando sinais muito tênues. Assim, qualquer problema e você terá falsos resultados. Por isso, quem usa a fMRI são cientistas muito bons. E sei que Gallant está sendo muito cuidadoso.

Fontes: O Globo
Enviada por JC

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