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Cuidado com as teorias conspiratórias sobre o vírus Zika

Na maior parte do tempo, teorias da conspiração são inofensivas. Todo mundo é suscetível a elas, em maior ou menor grau, e muitas sobrevivem ao tempo sem afetar ninguém. Mas de vez em quando, algumas dessas lorotas se espalham como vírus – e podem afetar muita gente. Ironicamente, foi um vírus real que inspirou uma das teorias conspiratórias mais perigosas da atualidade, especialmente por vir ganhando adeptos na internet: a ideia de que o vírus Zika foi causado por mãos humanas. 

O primeiro post relacionado a essa ideia maluca apareceu em uma sub-categoria do Reddit sobre "conspirações". Assinado pelo usuário redditsucksatbanning, o texto afirma que uma pequena empresa britânica, chamada Oxitec, teria sido responsável pela epidemia, enviando mosquitos com o vírus Zika ao Brasil por acidente. 

É sabido que a Oxitec enviou mosquitos geneticamente modificados ao Brasil, em 2011, que foram esterelizados a fim de conter o surto de dengue na região Nordeste. A estratégia da empresa, ao enviar os mosquitos, era contaminá-los com um gene letal para a espécie, e permitir que cruzassem com fêmeas. Um estudo feito em Juazeiro, ao fim de 2011, confirmou que a população local de Aedes aegypti que continham a doença diminuiu em mais de 90%. A ação serviria para conter ambas as doenças, já que o mosquito é responsável pela transmissão de ambas. 

Mas o post do Reddit relaciona o envio dos mosquitos à localização dos primeiros surtos de Zika no Brasil. A alegação foi repetida em sites marginais de notícias, o AntiMedia, apenas três dias depois do post. A reportagem incluía um mapa que supostamente indicava onde os mosquitos haviam sido entregues e sua proximidade com as cidades onde o Zika se espalhou primeiro por aqui. Só tem um problema: existem duas cidades chamadas Juazeiro no Brasil – e o site apontou para a cidade errada. A Juazeiro onde os mosquitos foram entregues fica há 300 quilômetros de onde a epidemia começou. A teoria também é furada em relação ao tempo: os mosquitos foram entregues quatro anos antes da epidemia. De acordo com pesquisadores, é mais provável que o Zika tenha chegado ao Brasil por conta de uma epidemia na Polinésia Francesa, em 2013. 

Mas a história, mesmo furada, continuou ganhando força. O canal russo RT, apoiador de Putin, também publicou a história, no último dia 30, incluindo citações de supostos "especialistas" contrários a biotecnologia. O próximo veículo foi o Daily Mail, tablóide inglês, que passou a teoria conspiratória adiante um dia depois. A partir daí, é claro, as redes sociais começaram a espalhar a história por aí. Um jornalista ambiental, autor do site Ecologist, colocou a culpa nos mosquitos geneticamente modificados. Cheio de jargões científicos, o artigo assume que a alteração genética dos mosquitos poderia ter gerado uma versão mais patogênica do vírus Zika. Contudo, a "autoridade" entrevistada pelo veículo é uma conhecida ativista contrária à bioengenharia, tendo se manifestado contra vacinas e autora de diversos textos sobre medicina holística. Além disso, a entrevistada derrapou em uma informação básica: os mosquitos não poderia inserir DNA adicional ao genoma do vírus Zika, uma vez que o Zika não possuí DNA – é um vírus com sequência de RNA. 

As consequências para se dar ouvidos a esse tipo de maluquice podem ser bem graves. As ações da Oxitec foram realmente funcionais para proteger brasileiros da dengue, e possivelmente do Zika. Seria um passo importante para garantir contenção da doença durante as Olimpíadas. Mas quanto mais a teoria cresce, pior para a gente: autoridades nacionais já estão barrando futuras estratégias dos cientistas por conta dessa suspeita. Não é a primeira vez que esse tipo de teoria conspiratória relacionada a doenças ganha o mundo – mas precisamos ser extremamente cautelosos ao decidir a que tipo de informações damos ouvidos. Quando se trata de salvar vidas, lorotas só nos prejudicam. 

Fonte: Galileu

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