post image

Empresa não pode se acomodar no padrão médio

O crescimento sustentável e rentável está cada vez mais difícil de ser alcançado no mundo corporativo, seja por pequenas e médias empresas, seja pelas maiores. Há uma década, apenas 13% das empresas que tinham como meta crescer o dobro dos mercados em que atuavam chegavam ao objetivo traçado pelos gestores. Nos dez anos encerrados em 2010, esse percentual caiu para 10%, ou seja, nove entre dez empresas fracassaram ao alcançar suas metas. 

Nos países emergentes, a situação é um pouco melhor: por causa das maiores oportunidades de expansão nesses mercados, 13% das empresas tiveram êxito em superar seus objetivos anuais. Por que isso ocorreu? 

\"Enquanto 6% das pessoas culparam o mercado, 94% delas apontaram problemas internos que impediram que os objetivos fossem cumpridos\", diz James Allen, sócio da Bain & Company e um dos autores de estudo que buscou avaliar o desempenho de empresas globais e como se podem construir empresas duradouras. Foram utilizados dados de mais de 3 mil empresas em diferentes países.
Com base nesses dados, Allen avalia que o crescimento rápido pode ser abreviado pelo ambiente cada vez mais complexo em que a empresa passa a atuar. O sucesso faz os empreendedores deixarem de lado a simplicidade e abandonarem a obsessão por atender os clientes da melhor forma possível. \"Aí passamos a ver empresas acomodadas a oferecer padrão médio de serviço, enquanto a complexidade das estruturas mata as empresas\", aponta Allen, autor, em parceria com Chris Zook, do livro \"O Poder dos Modelos Replicáveis\", editado no Brasil pela Elsevier Editora. A seguir os principais trechos da entrevista de Allen:
Crescer de forma rentável e duradoura é algo que está sendo cada vez mais difícil para empresas do mundo todo?
 
James Allen: Sem dúvida. Segundo análise em um banco de dados com empresas globais, vimos que nos países desenvolvidos só uma em cada dez empresas consegue crescer acima do mercado em que atua e dentro das suas metas. Nos mercados emergentes, esse percentual é um pouco maior: 13% das empresas conseguem crescer mais. Essa pequena diferença está ligada ao grau de amadurecimento dos mercados. Quanto menos maduro, maiores oportunidades. Fomos então atrás para analisar o que ocorria, por que sete em oito empresas não conseguiam chegar às metas. Descobrimos que apenas 6% delas culpam os mercados, enquanto 94% delas alegam que problemas internos impediram o sucesso de suas estratégias.
O que acontece com essas empresas? Como elas perdem a oportunidade de crescer mais do que o mercado?
Allen: A maioria das empresas com crescimento rápido busca mais do que aumento de faturamento todos os anos. Elas buscam ser reconhecidas e liderar os setores em que atuam. Elas querem crescer e, para alcançar essa escala, elas sacrificam o que foi o segredo do sucesso delas: a simplicidade, a ambição de buscar sempre o melhor. Para que essa estratégia de expansão seja bem sucedida, é essencial que, além da receita e dos clientes, as suas competências também cresçam. Essas empresas são criadas pelos fundadores, com o foco em oferecer os melhores serviços para toda a base de clientes. Elas são ágeis. Atraem e retêm seus colaboradores. Tudo vai bem, até que, em muitos casos, elas se perdem em uma espiral de complexidade. Elas perdem essa essência. Em vez de buscar atender todos os clientes com os melhores serviços oferecidos, elas padronizam soluções, oferecendo serviços médios. Deixam de liderar, de criar o novo, o simples. Morrem na complexidade criada por elas mesmas. Na década de 80, todo o mundo falava das empresas japonesas. A Sony era o exemplo maior de sucesso. Para ouvir música e jogar golfe, o fundador da empresa tinha criado o walkman. Depois a empresa se perdeu na complexidade. Veio a Apple, que criou o iPod, tornando as coisas mais simples.
Um dos principais erros é então atender ao padrão médio de clientes e oferecer serviços padronizados? Há outras falhas comuns que são percebidas?
 
Allen: Ao se observar pequenas, médias e grandes empresas, se nota que elas perdem o ímpeto quando começam a focar no cliente médio e querem padronizar os serviços com foco nele. O foco passa a ser o médio, o padrão, não o melhor, o que diferencia. Ou seja, perderam o vigor inicial que tinham quando foram criadas pelos fundadores. Falar de um cliente médio é reduzir as coisas, cada um tem suas particularidades. Quando crescem, as empresas passam a falar de coisas mais abstratas, de números, tendências, e deixam os consumidores, as pessoas de verdade, de lado. Perde-se muito tempo em algumas reuniões com gestores interessados em saber como vai se aumentar a margem ebitda de 27,1% para 27,3%, um debate matemático. Fazer isso é morrer na complexidade.
O que as pequenas e médias empresas podem fazer para se estruturar melhor e evitar esses percalços?
 
Allen: É importante entender que, quando se começa um negócio, a ambição é ser ágil, oferecer serviços simples e atender os clientes com os melhores serviços disponíveis. Por que a empresa que nasce quer ser uma múlti, uma gigante? Ela tem de querer construir seu próprio caminho e não perder sua identidade. Os gestores devem ir atrás dos clientes que estão mais satisfeitos e daqueles que proporcionam melhor rentabilidade. Devem perguntar a eles por que eles gostam do que eu ofereço, quais as minhas vantagens. Isso permitirá que a empresa, ao fazer isso, nunca perca sua essência. Ela saberá o que é preciso replicar um modelo de simplicidade e agilidade que ambiciona ser o melhor sempre. Ela saberá seus pontos fortes e até o que pode ser melhorado. É essencial também que nas empresas se discuta, se debata, se crie o conflito, porque a partir dele é que surgem as melhores ideias e pode-se crescer sempre. Outro ponto a ser observado: independentemente do porte, as empresas, ao crescerem, buscam novos mercados de atuação, sejam em outros Estados, sejam em outros países. Mas isso faz sentido? Primeiro, você deve conhecer o mercado em que quer atuar. Depois, ver quais as vantagens de ir para esse mercado.
No Brasil, grande parte das empresas é de origem familiar. Isso traz eventuais conflitos. Como resolver isso?
 
Allen: Assuntos familiares mal resolvidos matam uma empresa. Isso não é algo que ocorre só no Brasil, mas no mundo inteiro, em pequenas e grandes corporações. Em muitas empresas, metade dos assuntos discutidos em reuniões de conselho e dos gestores se refere a questões familiares. É essencial separar as coisas. É primordial não misturar emoção com os negócios. Não se pode deixar que necessidades imediatas de dinheiro possam influenciar estratégias e fazer com que empresas ingressem em mercados que estão crescendo rapidamente, mas que estão distante do foco. A estrutura de holding tem funcionado bem em muitos casos ao fazer essa separação.
Um problema grande no Brasil é a formação de mão de obra especializada. As empresas têm disputado talentos. Como vê isso?
 
Allen: Esse é um problema mundial e tem destaque no Brasil, onde a educação tem algumas falhas. Muitas empresas conseguem crescer mais seus negócios do que compartilhar seus resultados com os funcionários. Muitas criam manuais, códigos com 20 maneiras do que os colaboradores devem fazer para lidar com os clientes ou transformam o que os fundadores faziam no início em regras curtas. Mas isso é burocracia, é ir atrás de um discurso pré-formatado que às vezes não condiz com a realidade.
Fonte: Valor Econômico
Compartilhar

Permito o uso de cookies para: