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Participação em esportes coletivos ajuda as crianças a se concentrar e melhora seu desempenho em sala de aula

Durante muito tempo persistiu a ideia de que o mundo se dividia entre os esportistas que malhavam o corpo e negligenciavam a mente e os intelectualmente privilegiados, mas avessos aos treinos. Hoje, com a comprovação de que o movimento é fundamental para aumentar os níveis das proteínas que ajudam a construir a infraestrutura neural necessária para a aprendizagem, essa dicotomia cai por terra. Curiosamente, porém, apesar dos frequentes relatos de que atividades físicas regulares são benéficas para o cérebro adulto, a ideia de que quem se destaca no esporte tem menos inclinação para atividades intelectuais ainda permanece entre muitos pais e até mesmo educadores. O artilheiro do time da escola é visto quase que como o contraponto do campeão da olimpíada de matemática, como se aptidão física se opusesse a cognição (e vice-versa). E, em muitos meios, ainda prevalece a crença de que deixar as crianças correr ou jogar bola pode ser uma espécie de alienação ao mundo do aprendizado ou, na melhor das hipóteses, mera diversão.

Pesquisas sugerem, no entanto, que essa forma de pensar é equivocada. O tempo gasto em passeios ao ar livre, corrida ou participação em esportes coletivos ajuda as crianças a se concentrar e melhora seu desempenho em sala de aula. Estudos recentes relacionaram o desempenho cognitivo dos alunos com parâmetros de atividades físicas como capacidade aeróbica (cardíaca, pulmonar e dos vasos sanguíneos) de responder a exercícios físicos intensivos e índice de massa corporal (IMC), que associa o peso com a altura. E o mais importante: envolver as crianças em programas de exercícios parece ajudá-las a se sair bem na escola, já que os treinos físicos expandem habilidades mentais, estimulando a formação de novas conexões entre as células cerebrais.

Em adultos, exercícios aeróbicos regulares estão associados à melhoria da capacidade intelectual e, com o passar do tempo, a uma taxa mais baixa de declínio cognitivo – e até mesmo a redução no risco de demência. Também há muito tempo a psicologia do desenvolvimento sugere que entre 2 e 5 anos existe forte correlação entre crescimento físico e mental. Nessa idade é importante incentivar a habilidade de manusear brinquedos e objetos do cotidiano. Nessa faixa etária é desenvolvida a base para o conhecimento do mundo real. Ao montar blocos ou manipular ferramentas, elas aprendem sobre as leis básicas da física: se deixar cair um martelo no pé ou prender o dedo na gaveta sentirá dor.

Embora os benefícios cognitivos dessa manipulação sejam bem conhecidos, somente na última década os cientistas começaram a perceber correlação mais estreita entre atividade física mais vigorosa e habilidades intelectuais em crianças. O psicólogo Charles H. Hillman e seus colegas da Universidade de Illinois examinaram resultados de pesquisas sobre exercícios e cognição, tomando por base estudos publicados desde a década de 90.  O trabalho incluiu 12 investigações sobre crianças e adolescentes, a maioria mostrando que altos níveis de aptidão física (mas não de força muscular ou flexibilidade) estavam vinculados ao melhor desempenho escolar. Em outras palavras, quanto mais fisicamente apto o jovem, maior a probabilidade de obter boas notas – uma relação que vale desde a pré-escola até a universidade.

O grupo liderado pelo neurocientista Hans-Georg Kuhn, da Universidade de Gothenburg, na Suécia, descobriu recentemente a relação entre capacidade aeróbica e coeficiente de inteligência (QI) em adolescentes. Em estudo publicado em novembro de 2009, os cientistas analisaram o desempenho de mais de1 milhão de jovens do sexo masculino em teses de aptidão física e de inteligência realizados quando se alistaram no serviço militar, aos 18 anos. Mais uma vez, os resultados indicaram que, de maneira geral, a capacidade cardiovascular (mas não a força muscular) estava vinculada à inteligência. E depois de explorar outras bases de dados na Suécia, os pesquisadores descobriram que uma boa condição física aos 18 anos estava relacionada a um alto nível de erudição no decorrer da vida.

Alguns pesquisadores sugerem que exercícios físicos podem ser benéficos para o desempenho escolar, basicamente, por estimular um conjunto específico de funções cognitivas. Muitas delas encontram-se sob a denominação geral de funções executivas – capacidade de planejar e conduzir ações. Na sala de aula, habilidades executivas ajudam os alunos a prestar atenção, decidir quando tomar nota ou fazer perguntas e organizar o dever de casa. Acredita-se também que participar de atividades físicas expande a memória de trabalho (capacidade de gravar itens como números e palavras durante um período suficiente para manipulá-los mentalmente). Estudos têm mostrado que os exercícios produzem um efeito menor – ou em alguns casos absolutamente nenhum – em habilidades perceptivas como reconhecimento de objetos, fluência em idiomas e capacidade de visualizar e manipular mentalmente objetos ou espaços.

Outra descoberta importante foi feita pela neurocientista Henriette van Praag. Ela e seus colegas do Instituto Nacional do Envelhecimento, em Baltimore, descobriram que os exercícios físicos aumentam a quantidade de proteínas que ajudam a construir a infraestrutura do cérebro para aprendizagem e memória em camundongos. Essas moléculas incluem o fator de crescimento endotelial (VEGF, na sigla em inglês), que promove o crescimento dos vasos sanguíneos, e o fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF, na sigla em inglês) que facilita o desenvolvimento de longos filamentos dos neurônios chamados axônios, que ligam uma célula à outra. Essa carpintaria biológica pode criar ou fortalecer grandes redes do cérebro que processam informação. O exercício físico pode induzir essa construção numa parte do hipocampo conhecida como giro denteado. Essa área geralmente está ligada a uma espécie de painel de comando no cérebro, que funciona em operações de memória, mantendo a unidade dos pensamentos para retê-los na mente.

Fonte: Mente e Cérebro

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