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O desafio de aprender outras línguas

Quem já fez uma viagem internacional sem dominar a língua falada no local para onde ia sabe bem o quanto essa situação costuma trazer insegurança e as possibilidades que a experiência oferece. Conhecer melhor um país estrangeiro é só uma possibilidade, o intuito pode ser obter melhores oportunidades na profissão, se comunicar e garantir mais subsídios para entender o mundo que nos cerca ou até mesmo impressionar alguém. O fato é que qualquer que seja motivo para aprender uma língua estrangeira, a intenção parece válida – principalmente se considerarmos que esse tipo de aprendizado na idade adulta pode ser um importante aliado no combate à degeneração neurológica.

Uma constatação interessante nessa área é que ouvir uma língua estrangeira como som de fundo pode ajudar as pessoas a aprender mais rápido, mesmo que não estiverem prestando atenção. A notícia parece muito boa, em especial se levamos em conta que gramática ambígua, vogais estranhas, expressões idiomáticas peculiares e tantas palavras novas fazem com que aprender outro idioma se torne uma tarefa árdua. Dois artigos científicos publicados recentemente sugerem que, mesmo quando não estamos ativamente estudando, aquilo que ouvimos pode afetar o aprendizado e que algumas vezes ouvir sem falar funciona até melhor.

Em um estudo publicado em 2015 pelo Journal of the Acoustical Society of America, linguistas descobriram que as pessoas que faziam intervalos entre o aprendizado de novos sons desempenhavam tão bem quanto aqueles que não faziam intervalos, desde que os sons continuassem como som de fundo. Os pesquisadores treinaram dois grupos de pessoas a distinguir entre trios de sons semelhantes – por exemplo, a língua hindi tem “p,” “b” e um terceiro som que os falantes de língua inglesa confundem com “b”.

Um grupo praticou distinguir esses sons uma hora por dia durante dois dias. O outro alternou entre 10 minutos dessa tarefa e 10 minutos de uma tarefa de “distração” que envolvia estabelecer equivalência de símbolos em uma folha enquanto os sons continuavam no fundo. De modo surpreendente, o grupo que variou as tarefas apresentou o mesmo desempenho que aquele que se concentrou em distinguir os sons o tempo inteiro. “Nosso cérebro nos permite tirar proveito das coisas nas quais já prestamos atenção e possibilita que continuemos a prestar atenção nelas, mesmo que estejamos nos concentrando em outra coisa”, afirma a linguista Melissa Baese-Berk, pesquisadora da Universidade de Oregon e coautora do estudo.

Em um artigo de 2016 publicado no Journal of Memory and Language, ela constatou que é melhor ouvir novos sons em silêncio em vez de praticar repetindo-os. Falantes da língua espanhola que aprendiam a distinguir entre sons da língua basca apresentaram um desempenho pior quando lhes foi solicitado que repetissem um dos sons durante o treinamento. As descobertas confirmam aquilo que muitos professores intuíam – uma combinação de prática concentrada e exposição passiva à língua constitui a melhor abordagem. “É preciso ir à aula e prestar atenção, mas, quando voltar para casa, ligue a televisão ou o rádio naquela língua enquanto estiver cozinhando o jantar, por exemplo, e, mesmo que não estiver prestando atenção completamente, isso vai ajudar”, garante Baese-Berk. 

UMA RODOVIA NA CABEÇA

Segundo estudo publicado em 2015 no Journal of Neurolinguistics, uma equipe de pesquisadores analisou a estrutura de fibras neuronais na substância branca em 22 estudantes iniciantes de mandarim (veja quadro na pág. ao lado). Os cientistas constataram que aqueles que apresentavam fibras mais espacialmente alinhadas no hemisfério direito do cérebro obtiveram pontuações mais elevadas em testes após quatro semanas de aula.

Os pesquisadores acreditam que fibras altamente alinhadas aumentem a velocidade da transferência de informações dentro do cérebro, funcionando como se fosse uma rodovia expressa. “Embora a linguagem esteja tradicionalmente associada ao hemisfério esquerdo, o direito, que parece estar envolvido com a percepção de modulações sonoras, pode desempenhar um papel crucial na distinção de tons de mandarim”, sugere o autor do estudo, o neurocientista Zhenghan Qi, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

Linguistas e psicólogos reconhecem que a aptidão para aprender idiomas e a forma como ela se manifesta no cérebro são questões complexas, que resvalam em temas como atenção e consciência, e envolvem ainda experiências e crenças a respeito da própria capacidade de adquirir conhecimentos. “A aquisição de linguagens é uma das proezas mais miraculosas do cérebro humano; só quando você tenta aprender uma segunda língua percebe quanto a tarefa é desafiadora, não só para alunos e professores, mas também para cientistas.”

DO LABORATÓRIO PARA A SALA DE AULA

Embora a aquisição de um idioma seja mais difícil quando somos adultos, existem estratégias que podem facilitar o aprendizado. A ideia é acostumar o cérebro ao novo idioma e, para isso, alguns passos são eficientes:

Observe pistas sociais: Sinais não verbais, como movimento dos olhos, gestos e elementos que sugerem lugar ou tempo (aqui e agora, por exemplo) costumam favorecer a compreensão de palavras, de frases e mesmo da gramática

Converse com o travesseiro: Uma boa noite de sono logo após treinar vocabulário ou outra prática pode ajudar a consolidar o que foi aprendido

Ouça a própria pronúncia: É possívelmelhorar esse aspecto ao gravar a si mesmo em conversação (em vez de ler um texto, por exemplo)

Encontre um parceiro: Praticar com um falante nativo é uma boa opção para se acostumar às cadências do idioma – e ainda ganhar um amigo estrangeiro

Desvie a atenção: Escutar a língua falada como “som de fundo” enquanto realiza outra tarefa, em especial logo após estudar, ajuda na distinção de sons semelhantes

Diga novamente: Ouvir e repetir palavras e frases diariamente torna o aprendizado mais rápido e é importante para a fixação e ampliação do vocabulário

Faça uma imersão: Talvez nada seja mais eficiente para aprender um idioma do que entrar em contato direto com a cultura durante um período. Viver e trabalhar com falantes nativos tende a ampliar essa experiência

Fonte: Mente e Cérebro

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