post image

A tremenda influência das bactérias do intestino

A flora intestinal, o conjunto de bactérias e outros seres microscópicos que habitam nosso intestino, nunca esteve tão em alta. A cada dia surgem estudos ligando esse universo dentro do nosso ventre a processos fisiológicos importantes e ao maior ou menor risco de encarar uma série de problemas de saúde — problemas, diga-se, que não se restringem ao aparelho digestivo. Desbalanços na microbiota, como a invasão ou a expansão de alguns tipos de micro-organismo, já são associados a perrengues na pele, nas artérias e inclusive no cérebro. Nesse contexto, também pululam experimentos com probióticos, bactérias do bem selecionadas e empacotadas para chegar ao nosso organismo por meio de suplementos e alimentos, caso de iogurtes e leites fermentados.

Para entender um pouco mais sobre esse tema cada vez mais caro à ciência e às recomendações de saúde, conversamos com Arthur Ouwehand, expert em microbiologia e nutrição e responsável pela área de pesquisa da DuPont Nutrition & Health, na Finlândia. O cientista é um dos convidados internacionais do próximo congresso do Ganepão, um dos eventos mais esperados do ano no campo da nutrição, em São Paulo, entre os dias 13 e 17 de junho.

O que a ciência já sabe sobre a microbiota e os probióticos

Há um aumento no volume de estudos focados no impacto da microbiota intestinal na saúde humana. Podemos considerar que praticamente todo sistema do nosso corpo tem alguma conexão com ela?

Arthur Ouwehand: Você está certo. É muito provável que a maioria dos sistemas do corpo humano seja direta ou indiretamente influenciada pela microbiota. Aliás, eles não seriam apenas influenciados pelos micro-organismos do intestino, mas também pela microbiota presente em outras regiões do corpo. Esses estímulos podem ser mais pronunciados, como no caso de algumas doenças, mas também podem ser bastante sutis e difíceis de detectar. 

A microbiota intestinal tem sido associada a doenças crônicas que ganham escala epidêmica, como diabete e obesidade. O que a ciência sabe sobre esse elo?

Há várias correlações observadas entre a composição da microbiota e condições de saúde ou doença. Isso não significa, porém, que sempre exista uma relação de causalidade. E mesmo que ela exista, fica a dúvida do que seria causa e do que seria efeito. A mudança da microbiota seria resultado da doença ou é a alteração ali que está causando a doença? Nosso desejo obviamente é que no futuro essas diferenças entre uma microbiota “saudável” e “doente” nos ajudem a indicar que micróbios estão faltando ou causando o problema. Isso abriria as portas para novos probióticos (não apenas os usuais lactobacilos e bifidobactérias) e eles poderiam auxiliar no manejo de tais condições. Mas ainda há uma longa estrada para chegarmos até lá.  

E a conexão entre intestino e cérebro? Até que ponto a microbiota interfere na cabeça?

Também aqui temos uma questão de causa e efeito que é difícil de separar. E, embora impactos dramáticos possam ser vistos em animais, normalmente não é isso o que se observa em seres humanos. É muito provável que a microbiota tenha um papel sobre a saúde mental, mas o que isso representa ainda está bastante aberto. 

Há quem defenda que os probióticos ajudam a curar diversos problemas de saúde. De acordo os estudos atuais, temos evidência suficiente para embasar tantos esses efeitos positivos?

Probióticos até podem ser utilizados como medicamentos. O Saccharomyces boulardii [uma levedura] é regularmente empregado com esse propósito, por exemplo. Mas a maioria não tem essa função. Isso significa que eles não curam, previnem ou minimizam doenças. A despeito de sua regulação, até mesmo o Saccharomyces boulardii não possui essa ação. No entanto, eles podem dar suporte a algumas funções fisiológicas comuns que atuam na redução do risco de uma doença. Um exemplo: probióticos podem diminuir seu risco de infecções no trato respiratório. Não há garantia de que você não terá um problema desse tipo enquanto estiver consumindo produtos probióticos, mas baixar o risco em cerca de 50% continua uma boa razão para considerar usá-lo durante um período. 

No Brasil há um número crescente de pessoas adotando receitas caseiras com probióticos, a exemplo de kefir, kombucha… Como o senhor vê isso?

Eu vejo como uma moda que irá passar. Não há nada de errado com isso e alguns desses produtos são até saudáveis. Ocorre que isso não significa que sejam, de fato, probióticos. Os micro-organismos nessas receitas não foram testados até agora no que diz respeito a benefícios específicos à saúde. Portanto, não dá para considerá-los probióticos. 

Fonte: Saúde

Compartilhar

Permito o uso de cookies para: