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Agressões gratuitas

O cenário dos serviços de emergências médicas no Brasil é preocupante. Nos hospitais públicos a superlotação e a crônica falta de recursos se associaram à explosão das epidemias infecciosas e da violência urbana em suas diversas formas: acidentes de trânsito, agressões domésticas, intoxicação por álcool e drogas, acidentes de trabalho, guerra do tráfico e ferimentos em assaltos armados têm apresentado incontrolável crescimento estatístico.

Por outro lado, com a crise econômica se instalando na sociedade brasileira, caracterizada por inflação e desemprego crescentes, elementos adicionais de frustração social e de insatisfação coletiva vêm agregando mais combustível à fogueira de intolerância e raiva que cresce nos corações e mentes daqueles que vivem em nosso caótico espaço urbano.

Cadê as promessas de que nos tornaríamos um país rico, onde teríamos uma vida de consumo e conforto? Cadê as boas escolas, a melhoria da segurança, o trânsito eficiente, as viagens de férias, o futuro luminoso e todos os outros sonhos prometidos e que tanto nos alegravam? Agora o que se anuncia para o brasileiro de classe média são tempos de sofrimentos e mágoas. E onde vai explodir esse acúmulo inconsciente de frustrações, essa silenciosamente acumulada energia de conflitos?

Parece que é no momento da necessidade médica urgente: seja para o filho com febre, seja para a esposa com suspeita de dengue, seja para si mesmo com um dor súbita. Carregando nas costas o peso de todos esses fardos físicos e sociais, o cidadão comum, desiludido, frágil e amargurado derrama toda a sua raiva e suas frustrações sobre a inocente recepcionista do pronto socorro particular.

Uma reportagem do jornal Bom Dia Brasil, da Tv Globo, exibido em 23 de abril, mostra que as agressões contra profissionais de medicina ultrapassam as fronteiras geográficas. Uma pesquisa encomendada pela Sociedade de Pediatria de São Paulo constatou que 70% dos pediatras já passaram por algum tipo de agressão durante o serviço. 63% foram agredidos verbalmente e 10% fisicamente. A pesquisa concluiu ainda que 4% dos pediatras já sofreram agressões verbais e assédio moral pela internet.

No Piauí o cenário não está diferente. Não é difícil encontrar casos de ameaças a atendentes, médicos e enfermeiros. No Hospital Prontomed Adulto, referência em atendimentos de urgência e emergência na capital, é cada vez mais comum esse tipo de situação. “Muitas pessoas chegam aqui com ameaças, gritos e chantagem exigindo serem prontamente atendidas”, ressalta a coordenadora de atendimento da urgência do hospital, Paula Craveiro.

Ela destaca ainda que todas as atendentes do setor são orientadas a não responderem aos pacientes revoltados, apesar das agressões extrapolarem os limites. “Há pessoas que xingam, humilham as funcionárias e em alguns casos agridem fisicamente”. Ela conta que nos casos mais graves foram tomadas providências judiciais, que resultaram em condenação dos agressores por danos morais.

No Prontomed Infantil, único centro médico privado no atendimento infantil em urgência e emergência de Teresina, onde são realizadas em média 300 consultas por dia, agressões paternas a médicos, atendentes e técnicos de enfermagem têm causado sérios danos emocionais aos membros das equipes. "Há casos de atendentes que estão sob assistência psicológica para tratamento de síndrome pós-traumática e síndrome do pânico" destaca a Dra. Socorro Mesquita, gerente de enfermagem do hospital.

A grande pergunta é: como entender que pessoas devotadas, dia e noite, todos os dias do ano, a aliviar o sofrimento alheio, com tanta dedicação, eficiência e amor, recebam em troca tanto ódio? "Afinal, apesar da enorme gravidade apresentada por muitas crianças que buscam nossos cuidados, não tivemos um só caso de morte de paciente durante o ano de 2015", afirma Dra. Socorro Mesquita.

Serão a tristeza e a dor os prêmios que merecem aqueles que praticam o sublime ofício de salvar crianças?

José Cerqueira Dantas

Colaboração: A.R

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