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É tempo de investir e cuidar mais do corpo e da mente

Sabe aquela situação em que a pessoa está acima do peso e não consegue emagrecer, daí ela desiste e passa comer tudo o que tem vontade, já que os esforços têm sido em vão? Com isso, ela engorda ainda mais e sua infelicidade só aumenta? Vejo acontecer algo semelhante no universo do trabalho. Quando as obrigações do dia a dia não nos fazem felizes, quando o estresse é permanente, damos ainda menos atenção para cuidarmos de nós mesmos. Assim, ficamos mais infelizes. A bola de neve só faz ganhar volume.

Há quase 10 anos eu escrevi um texto que falava sobre o chamado ROI (retorno sobre o investimento) do corpo e da mente. Dizia que tratar aos outros e a si próprio com dignidade é o princípio máximo da vida, e que respeitar os limites não é perder competitividade, e sim competir de maneira sustentável. Só assim se obtém o maior ROI das pessoas e das empresas.

O artigo remetia ainda a uma reflexão do filósofo inglês Thomas Hobbes, que diz que primeiro é preciso viver, para depois filosofar. Ou seja, antes de refletir sobre nossa existência, temos de cuidar da nossa vida. E aí eu reforço a pergunta: mas como cuidar do corpo, da alma, da mente, do amor, dos filhos, dos amigos, das finanças e ainda ser bem-sucedido profissionalmente neste clima de guerra?

Impressionante como os ciclos se repetem neste país, e como aquele mesmo texto poderia ser reproduzido hoje na íntegra. Aos desafios trazidos pelo mundo corporativo e às dificuldades no desenvolvimento de carreira soma-se um cenário político, econômico e ético profundamente abalado.

Se mal estamos dando conta de cuidar do básico diante da complexidade que o ambiente atual nos traz, fica realmente difícil falar em cuidar dos nossos ideais, da nossa alma. Frente a isso, penso se o melhor caminho não seria pensar em simplificarmos as nossas vidas.

Costumamos dedicar tanto esforço para administrar nosso lado profissional que quase não resta ânimo para todos os outros aspectos - que muitas vezes são justamente os que nos motivam a trabalhar, já pensou nisso?

Será que é possível evitar que as tensões, conflitos e medo enterrem as relações? Eu acredito que sim. Sei que não é fácil quando se está no olho do furacão, mas deveríamos aprender a colocar nossos problemas em suas devidas caixinhas, sem deixar que eles ocupem um espaço na nossa vida maior do que merecem.

Claro que o trabalho, por si só, deve ser uma de nossas fontes de felicidade. Mas já faz um bom tempo que ele tem sido o maior causador de estresse na vida das pessoas.

Volto à tecla de sempre: para transformar esse efeito destrutivo em algo que traz benefícios para as pessoas, o trabalho precisa permanentemente estar ligado a uma questão de propósito, de significado. Talvez a crise moral que vivemos no Brasil possa resgatar esses valores com mais força à medida que os indivíduos e instituições concluam que chegamos a um limite e comecem de fato a agir.

Cada um à sua maneira, temos de encontrar tempo para não fazer nada, tempo para meditar, tempo para nos divertirmos. Quando conseguimos fazer esse exercício de elencar o que mais importa em nossa vida, a chance é grande de encontrar um maior equilíbrio.

Todos nós sabemos - e muitos sentimos na pele - os efeitos da negligência com o corpo e com a mente. Empresas também têm investido em programas de saúde. Mas, ainda assim, não tenho certeza se os indivíduos e as empresas estão realmente preocupados em tomar consciência de seus atos.

Estou falando de algo mais profundo do que começar a fazer aulas em uma academia de ginástica. Refiro-me a um movimento de dentro para fora, que envolve - como sempre - reflexão e autoconhecimento.

O corpo reflete o tratamento que lhe dispensamos. Vamos aproveitar essa época de final de ano, em que todos procuram parar um pouco para pensar sobre o futuro, para medir o tal ROI do corpo e da alma - e traçar algumas metas para melhorar esse índice.

Vicky Bloch é professora da FGV, do MBA de recursos humanos da FIA e fundadora da Vicky Bloch Associados

Fonte: Valor

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