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A difícil missão de conciliar o estudo e as demandas do trabalho

Entre reuniões e as metas estabelecidas nas empresas, não é raro que a carga de trabalho dos executivos vá muito além das tradicionais oito horas diárias, invadindo, inclusive, fins de semana e feriados. Paralelamente, o mercado exige que esses profissionais continuem estudando e se atualizando. Tanto que o MBA é visto, hoje, como um passo natural em suas carreiras. Muitas vezes, essas duas demandas acabam sendo incompatíveis. Mesmo quando o executivo consegue acompanhar as aulas - indo durante a noite e aos sábados, ou fazendo semanas de imersão - acaba não dando conta de ler os livros, realizar tarefas e se reunir para trabalhos em grupo. Não é apenas uma questão de gestão do tempo. Existem momentos em que não é possível encaixar todos os compromissos na agenda, e um replanejamento se faz necessário.

É o caso de Yassue Inoki, de 40 anos. A executiva que fez carreira na área de tecnologia em empresas como Citibank e Intelig, entrou na Globo em 2004 para coordenar a área de operações comerciais internacionais da rede. Era responsável por, entre outras tarefas, cuidar da venda de conteúdo produzido pela empresa. A mudança aconteceu no mesmo período em que Yassue voltou a estudar - estava fazendo uma pós-graduação em gerenciamento de projetos pela UFRJ.

Mas a dinâmica do mercado acabou com os seus planos iniciais. A Globo decidiu criar uma operadora própria para distribuir o seu conteúdo na Europa, no modelo "direct to home" via satélite, e Yassue era a responsável pelo projeto. "O prazo para montar a operação era de sete meses e tínhamos que fechar contratos com bancos internacionais. Isso sem contar todo o desafio de engenharia e a parte jurídica. Era um projeto pioneiro", lembra. Ela decidiu, então, pisar no freio da parte acadêmica. "Faltavam seis meses para concluir o curso. Conversei com os professores e eles até tentaram flexibilizar horários, mas não teve jeito. O caminho foi trancar."

Yassue ressalta que pesou na decisão de parar o curso o fato de estar vivendo entre São Paulo e Rio de Janeiro para cuidar do projeto. Não havia tempo hábil, nem energia, para estudar e fazer as tarefas. "A operadora era a prioridade. Estava tão empenhada em fazer tudo funcionar que não questionei minha decisão, nem pensei no investimento financeiro que tinha feito na pós."

Depois de sete meses em ritmo acelerado para dar conta do desafio, o projeto foi concluído, mas ela só conseguiu retomar o programa dois anos depois. "Levei mais um ano para completar o que faltava, mas foi interessante porque consegui levar minhas novas experiências para dentro do curso", conta. Yassue, que ficou na Globo até 2013, está trabalhando como consultora e estuda propostas para voltar ao setor de mídia ou telecomunicações. Enquanto não decide qual será o próximo passo profissional, ela já sabe que vai voltar a estudar. "Estou pensando em fazer um MBA executivo. Não vai ser fácil conciliar, mas vou dar um jeito."

A dificuldade de equilibrar as exigências profissionais com a demanda acadêmica também foi um problema para João Arnaud. O consultor, de 39 anos, já tinha uma experiência bem-sucedida de combinar os estudos com a carreira ao concluir uma pós em administração, em 2001. Nove anos depois, decidiu começar um MBA em finanças. Arnaud, que trabalha na PwC desde 2006, escolheu o Insper e recebeu uma bolsa de 80% da empresa. "Como já tinha passado por isso antes, achei que iria conseguir novamente", afirma.

Aulas presenciais duas vezes por semana à noite e a monitoria aos sábados faziam parte da grade curricular. No início, Arnaud manteve o ritmo, mas seu primeiro filho nasceu na semana de provas. A rotina de pai recente passou, então, a consumir boa parte da sua energia. "Somando as responsabilidades da empresa com as familiares, não era possível continuar estudando", conta.

Na ocasião, Arnaud optou por trancar o curso e voltou depois de um ano - não sem antes fazer algumas mudanças. "O normal é fazer duas matérias por semana. Optei por fazer uma só e, mesmo demorando o dobro do tempo para terminar, valeu a pena. O meu aproveitamento foi melhor."

Com o término do programa, falta apenas entregar o Trabalho de Conclusão de Curso, o que não seria um problema. Ele, no entanto, foi convidado para fazer uma imersão profissional de três meses na PwC de Nova York no fim do ano passado. "Era uma experiência única e tive que aproveitar. Nem cogitei fazer a monografia durante esse período", afirma. De volta ao Brasil, Arnaud tem até o fim deste mês para resolver a pendência, o que vai fazer nos próximos fins de semana. "Só não vou poder ficar em casa, porque meu filho me chama para brincar. Acho que vou ter que escrever do escritório."

Mas nem sempre parar tudo é a melhor resposta. Cristiano Carvalho, de 38 anos, optou por tentar equilibrar as demandas profissionais com as exigências acadêmicas. O executivo atua no setor de aviação e passou vários anos morando em países como Cingapura e Estados Unidos. Quando retornou ao Brasil, em 2011, para atuar na United Technologies, achou que era o momento perfeito de voltar a estudar. "No exterior, minha vida era muito corrida. Tinha que visitar clientes na Austrália, no Japão e ficava 80% do tempo viajando. Isso sem contar que a minha filha nasceu nesse período. Com a volta, imaginei que, finalmente, conseguiria tempo para fazer um MBA."

Carvalho escolheu um programa do Iese, mas uma proposta inesperada acabou com a tranquilidade prevista. "Entre marcar e começar o curso, recebi uma proposta da Rockwell Collins. O desafio era muito interessante e resolvi aceitar", conta. Para atuar como gerente geral de serviços da gigante americana de aviação, o executivo precisou mudar com a família para São José dos Campos, no interior de São Paulo. "A mudança, mais os desafios de um novo emprego e um curso muito puxado, cobraram o preço. Tive um desempenho fraco no primeiro quadrimestre, bem abaixo do que eu esperava", conta.

O momento era crítico. "Conversei com os professores e com a minha empresa. Fizemos mudanças e resolvi continuar". A empresa passou a proteger o dia das aulas, evitando marcar reuniões, além de liberar o profissional para fazer a semana intensiva de treinamento - cinco vezes em 18 meses de curso - sem exigir que ele usasse as suas férias. "Tive muito apoio. Se a empresa não entende a importância da educação executiva, nem adianta o profissional tentar", afirma.

As suas notas comprovaram a diferença. As notas C do início do curso transformaram-se em A e B. "Existem empresas que acreditam que vão perder o funcionário após o MBA, pois ele abre muitas portas. No meu caso, especialmente pela postura adotada, tive uma identificação muito grande com a empresa", diz Carvalho, que deve concluir o curso no mês que vem.

Um dos principais problemas para gerenciar formação e carreira está nas infinitas reuniões com diversos funcionários em vários lugares do mundo. Neste cenário, o executivo precisa estar disponível, praticamente, 24 horas por dia e 7 dias por semana. É o caso de Brigitte Ann Nielsen, 39 anos. Formada em direito, a gerente de relações sindicais para América Latina da IBM está há nove anos na empresa e já desistiu de uma pós-graduação em direito previdenciário por não ter condições de conciliar a agenda.

Em sua opinião, a expectativa de que o profissional vá estar presente dois dias por semana, ainda que durante a noite, além dos sábados, é exagerada. "Se o cargo demanda interação com diferentes países e horários, essa demanda se torna irreal. Nesse caso, o ensino acabou defasado ante a realidade do mercado", diz.

Brigitte tinha desistido temporariamente da formação executiva até encontrar um modelo diferente de curso. Quando descobriu o MBA da Fundação Dom Cabral (FDC), que combina ensino a distância com uma semana de imersão a cada três meses nos 18 meses de curso, ela viu um caminho para continuar. "Dessa forma, fica muito mais fácil me programar. Eu sentia falta de estudar, mas não tinha como conciliar o trabalho com o modelo tradicional dos cursos", afirma.

Na vida dos executivos, a incompatibilidade entre estudo e carreira pode ser algo temporário. Isso pode acontecer por conta de um novo projeto que demande atenção exclusiva e, nesse caso, o melhor caminho pode ser esperar passar o furacão. Em muitos casos, a situação pode exigir uma conversa com a empresa pode resolver. Como o mercado valoriza a formação executiva, os profissionais precisam continuar atentos para voltar às carteiras, seja no modelo mais tradicional ou em formatos alternativos combinando ensino a distância com reuniões de imersão.


Fonte: Valor Econômico

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