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Como proteger seu cérebro

A capacidade de armazenar informações pode ser comparada ao desempenho de um atleta. É na juventude – entre os 20 e os 30 anos – que a memória costuma estar em sua melhor forma. Depois dos 50, a maioria das pessoas começa a notar falhas aqui e ali. Trata-se de um processo normal, lento e gradativo, que começa décadas antes. Não é, necessariamente, sinal de doença grave. Com o passar dos anos, fica mais difícil lembrar algumas informações ou reter novas memórias. Outras continuam acessíveis como sempre estiveram. É por isso que um idoso é capaz de contar histórias da infância, em mínimos detalhes, mesmo quando não lembra onde colocou as chaves de casa poucos minutos antes.

Quando as falhas se tornam frequentes, muitos idosos e familiares procuram exercícios, suplementos alimentares ou fórmulas mágicas para estimular a memória. Existirá alguma? Ler, talvez. Tocar piano? Resolver exercícios mentais pelo computador? Sozinha, nenhuma dessas atividades basta. O importante é diversificá-las.

“Há uma lenda de que o sudoku é bom para o cérebro”, diz a professora Yeda Duarte, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP). Passar muitas horas ordenando os números desse quebra-cabeça japonês não parece render grandes benefícios.

Desde 2000, pesquisadores da USP acompanham mais de 2 mil moradores paulistanos. Todos têm mais de 60 anos. Alguns já passaram dos 100. “Os que envelhecem bem fazem de cinco a sete atividades diferentes por dia”, diz Yeda. Ir ao teatro, fazer trabalho voluntário, visitar um amigo, ler, aprender alguma coisa...

Sem estímulos novos, diminui a capacidade natural que o cérebro tem de criar conexões alternativas entre os neurônios – algo que compensa, ao menos em parte, a perda dessas células nervosas na velhice. Com pequenas adaptações,  atividades cotidianas podem trazer benefícios. Quem é destro submeterá o cérebro a um belo treino se começar o dia escovando os dentes com a mão esquerda.

Outra boa providência é desligar o GPS do carro e se aventurar por um caminho diferente. Desde, é claro, que isso seja feito em segurança. Vale considerar também as vantagens da terapia do dinheiro curto. “Ir às compras com o orçamento apertado é um excelente exercício”, diz o médico Edson Amaro Jr., coordenador científico do Instituto do Cérebro do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

É preciso andar de loja em loja (atividade motora), comparar preços (raciocínio), registrar mentalmente as ofertas (memória), prever os gastos (planejamento), interargir com os vendedores (comunicação) e ler nos olhos deles a intenção de cada um (empatia) para conseguir negociar.

Mexer o corpo é fundamental. “Atividade física é muito mais importante para o cérebro que fazer palavras cruzadas”,  diz Amaro Jr. “Uma partida de basquete o obriga a desempenhar muitas funções sofisticadas.” Os músculos dos sedentários e das pessoas com dificuldades de locomoção perdem volume. Essa condição, comum na velhice, aumenta o risco de quedas. O prejuízo vai além das fraturas. Uma alteração na capacidade de interagir com o meio pode provocar a perda das funções cognitivas.

A consequência pode ser dramática: mudança na conexão entre os neurônios, perda de volume de algumas regiões cerebrais e uma degeneração irreversível, como o Alzheimer. Por enquanto, os medicamentos disponíveis apenas retardam a progressão da doença. A maioria das pessoas que apresentam  sintomas depois dos 65 anos não tem histórico familiar.

A genética pode ser responsável por um pequeno número de casos. Alguns genes aumentam o risco de desenvolvimento do Alzheimer. Mas seu peso é relativo. “A alteração genética não é determinística”, diz o pesquisador Michel Naslavsky, do Centro de Estudos do Genoma Humano, da USP. “Outros componentes favorecem o aparecimento da doença, como o AVC e até outros fatores genéticos ainda desconhecidos”, afirma.

Em menos de 5% dos casos, os genes não apenas aumentam o risco, mas causam a doença. Nessas famílias, o Alzheimer acomete geração após geração. Em geral, precocemente (entre os 30 e 40 anos). Com exceção dessas pessoas, diminuir o risco de declínio cerebral é algo que está ao alcance da maioria. O que protege contra o Alzheimer não é ter mais neurônios – e sim ter mais conexões entre eles. Nunca é tarde para criá-las.
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Fonte: Época

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